sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

CONVULSÕES DO ESPÍRITO

     


    É neste grande momento de convulsão existencial que vos escrevo, o Homem afastou-se mortalmente do reino do espírito apaixonando-se cegamente pela matéria.

            O Homem esqueceu-se de onde veio, da fonte divina da consciência, adotou os modos dos seres inanimados esquecendo-se que deriva da seiva do mundo vegetal, a qual o alimentou quando a matéria não era mais do que um pensamento no alvorecer do pensamento.

            Esqueceu-se das coisas divinas, o amor e a sexualidade foram reduzidas a desejos primatas desprovidos de conteúdo, sabem ainda alguns felizmente que nada disto é real no sentido lato da palavra, o amor e o sexo são expressões da divina eternidade do espírito que reside no nosso involucro biológico, estar a catalogar sentimentos desta magnitude e importância desprovendo-os da sua raiz Universal é arremessar tudo que veio antes para as trevas do mundo primordial.

            Saturno regia esse mundo, ele subjugou a Deusa Mãe Terra impedindo-a de lar luz à vida, então entrou em cena o Deus do Sol, a luz permeou aas trevas e a vida tornou forma, depois veio a queda e a estrela da manhã, Vénus, que trouxe consigo o mal necessário para a evolução e o Deus da Lua desceu para colocar em cheque esse novo poder adquirido.

            O Homem perdeu-se nos caminhos subterrâneos, mas em vez de neles encontrar caminho para a salvação através da iniciação da morte em vida e do renascimento da morte, perdeu-se nas suas artimanhas e começou a gostar de sangue, embriagado, o Homem banhou-se no sangue dos deuses e dizimou os seus conterrâneos.

            Assim vemos que um mundo criado sob os doze signos do zodíaco cada um representando um corpo celeste, abandonou o amor e o divino e eterno significado da intimidade entre seres.

            O Homem, pois, rendeu-se à ilusão, e na beleza por vezes enganadora sentiu que era por ela que o amor e sexo residiam, por isso bastou um olhar para mudar o rumo de toda uma história.

            O Homem via-se agora a fitar fundo no abismo sabendo que se demorasse o suficiente ele fitá-lo ia de volta, e O Homem gostou desse sentimento e viciou-se nele, deixou de procurar o amor no coração, fechou o terceiro olho e a glândula pineal endureceu.

            O homem criava agora esqueleto e o crânio humano, por fim o cérebro e com ele os Homens rejeitaram a mente em troca do material e imediato prazer, os corações pararam de guiar o amor e o mundo tornou-se um mar de umbigos embriagados pela sensação que o Sol, um deus girava em torno de si.

            O conceito de beleza pode ser bastante subjetivo e o facto de apenas um reflexo no espelho poder roubar a sanidade afastando-nos do verdadeiro caminho torna-se bastante difícil para aqueles que tapados pelo seu próprio reflexo não vêm além deste, fomos consumidos pelo imediatismo e pelas máscaras produzidas outrora pela estrela da manhã, Vénus tomou conta do espírito e a consagrada forma de amar mudou, e o sexo tornou-se um ato primitivo de apenas estreita reprodução e nada mais.

            Aqueles que de nós ainda caminham nos Mistérios sabem, no entanto, a falsidade desta ideologia e aos poucos derrotados pelo peso do nosso ego, reaprendemos a viver no espírito, e seguimos firmes no caminho que nos foi ocultado que a mente precedeu a matéria e que a matéria é passageira, apenas uma ilha num mundo de consciências interligadas.

            O Homem reencontrou na sombra do carvalho e do espinheiro branco os caminhos da Deusa Mãe, a Terra, nos braços lunares de Vénus outrora violentos são agora gentis, em casa fase da lua uma celebração, em cada palavra, música, poema, dança, equação matemática, um feitiço, o Homem redescobriu a magia através da Natureza, a mesma da qual descendemos e à qual pertencemos.

            Pensar que a natureza foi criada para nos servir, é a maior arrogância da Humanidade, e agora após tantos anos de maus tratos vemos como os deuses protetores dos elementos optaram pela via da guerra, munidos, de tempestades, de trovões, de vagas medonhas de azul turquesa. Acompanhado pelas dríades e as fadas, os querubins e o povo antigo, formou um exército e o Homem treme, e teme, e devia, pois, se a Natureza é destruída nós seremos destruídos também pois pertencemos a ela.

            Honremos, portanto, as divindades que nos suportam, dia a dia e que sempre o fizeram, que tornam a nossa existência com sentido, pois, somos feitos do mesmo tecido, rendilhado ao longo de milhares de anos, todos entrelaçados numa formidável criação.

            Honremos, pois, o amor e o que brota dele, a intimidade, o fundir de corpos que vai muito mais além do que um estéril vazio material e carnal.

            Sejamos ousados e vejamos a beleza mais nas ações e nos corações do que nas velhas máscaras que nós próprios fabricámos para esconder quem somos.

            Sonhemos, pois, e imaginemos, não nos contenhamos no prazer de fazer fluir a imaginação para questionar a doutrina que nos fizeram engolir ao longo do tempo.

            E que este tempo seja o único, o único que temos e o único que merece ser vivo, um eterno e terno momento presente.

 Bruno Carvalho

sábado, 15 de fevereiro de 2025

CORPO E ALMA



Desespero que despedaça o corpo e a alma

Descida vertiginosa ao abismo da hora mais negra

Na espiral desenfreada do tempo

A lembrança de um desejado esquecimento.

 

Na desolação de um mar de sargaço

A estranha harmonia de uma sereia

Seus cantos esquecidos nos idos de março

Seus cabelos enlaçados na lua cheia.

 

E a noite se fez espanto e anseio

Consorte esquecida de tempos idos

Tempos de antanho muitas vezes lembrados

O meu corpo e alma na laje despojados.

 

Tanto no mar como na terra

Assim em baixo como em cima

Uma alma que tanto esperneia como berra

Tanto silêncio que nem o canto anima.

 

Os despedaçados despojos do corpo e da alma

Afundados na podridão que a noite acalma.

 

Bruno Carvalho

sábado, 8 de fevereiro de 2025

ESPELHO DA MANHÂ



Escrevo com letras marcadas pela paixão

Na corrente apressada do tempo

Palavras perdidas de sentido e significado

Discursos feridos transcritos de corações gelados

 

Fiquei de olhos bem abertos

À espera da aurora daquele dia de Outono

O sol não voltou, fiquei petrificado na escuridão

Certo que tu não voltarias fechei a janela da esperança

 

Ficaram comigo os teus silêncios e perdas

As memórias vencidas pela crueldade do destino

Mergulhadas na frieza do orgulho

Afogadas nas correntes do medo

 

Escrevi com letras marcadas pelo amor

Frases escorreitas apanhadas em ventanias invernais

vi-me revolto num turbilhão de emoções

enquanto a noite morria, morria o meu conforto

 

senti o desconforto renascer em mim

uma ferida aberta que o tempo não ousou curar

vi no espelho da manhã

os mesmos olhos que me prenderam à vida

Bruno Carvalho

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

LUNA


Imagem de https://pixabay.com/pt/users/bessi-909086/

Acordei com o miar dos gatos no telhado,

A noite ia ainda jovem,

A luz lunar infiltrava-se por entre os buracos dos estores,

E eu entre a vigília e o sono ancorava no esquecimento.

 

O teu corpo ao meu lado transpirava emoções

Dos meus lábios brotavam sabores diversos, fantasias suspiradas

Os amores soprados por quimeras perdidas

Embriagado pelo teu olhar, afoguei-me no teu sorriso.

 

Virei o corpo no mar de pétalas espalhadas nos lençóis

A luz das velas marejava o silêncio tranquilo

No copo o vinho tornou-se rubi,

Cor de sangue do fogo que nos consumia

 

Naquele abraço eterno alimentei as chamas

A nossa solidão, uma ferida curada pela noite

Da primeira luz derramada alimentei o prazer

Do primeiro sangue oferecido alimentei a desgraça

 

E quando ambos metal e carne se encontraram

Beijei os teus lábios e provei a morte

Rasguei o véu, abri o estore, deixei a lua entrar

Da luxúria do desejo desabrocharam cumplicidades

 

Amarrei a saudade à cama

Os gatos já não miavam

Luna havia partido

E ambos metal e carne suspiraram um último adeus.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

DAISY



Dou um passo no escuro do abismo

Um salto de fé, um mergulho espontâneo

Às vezes é preciso perder medos

Para não perdermos pessoas.

 

Fixo o meu olhar na tua foto

Marco a tua imagem no meu coração

No teu olhar está o antidoto

Para curar de mim o veneno da solidão.

 

Dos teus lábios brotam palavras em forma de luz

A tua pele suave reluz na aragem da meia noite

Um espelho partido que colo com cuidado e nele reluz

Aguardo como uma criança que o amor em mim pernoite.

 

A paixão e a tua energia preenchem-me o peito

Do teu divino regaço brotam rosas carmim

Amarrado à esperança aguardo neste leito

O teu regresso aos meus sonhos, o luar que há muito foge de mim

 

És luz na noite que me guia a bom porto

Eu feito navegante perdido na tormenta

Mais vale perdido que morto

És sereia no meu mar, estás onde a maré arrebenta.

 

Forjados na tempestade, longe, mas sempre perto

Somos um só, dois corações apenas uma alma

Estou acordado meu amor, sempre vigilante e desperto

À espera que a luz da manhã me traga a calma.

 

Depois serei rouxinol e farei ninho no teu seio

Para sempre imperfeito, para sempre fiel

És tu quem ouso querer, és tu quem anseio

Que me tragas nos teus lábios a doçura do mel.

 

Hoje, aqui, presente imperfeito

Hoje aqui o amor nunca desfeito

Na pureza do teu canto angelical

No abraço eterno do teu corpo divinal.

 

E far-me-ei poeta feliz pois morarei lá no teu lugar secreto

Onde os meus lábios pousaram em perfeita sintonia

Sorvendo de ti a força do meu espírito desperto

Rainha da noite que tão bela ode cantas em perfeita harmonia.

 

Bruno Carvalho

MOMENTO

Nem a sombra da manhã fugindo Nem o céu que derrama lágrimas angelicais Nem a tarde que se faz fogo, furiosamente rugindo Nem a noite ...

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