domingo, 16 de março de 2025

DESTINO



             Sou um fantasma deste tempo, o único tempo que existe. Caminhando pelo mundo pelo caminho menos trilhado, observo todos que passam por mim, insensíveis à minha tristeza seguem mudos pelas ruas meio desertas, desnudadas de vãos contentamentos, despejadas de cor e alegria.

            A invisibilidade dá-me a pureza de estar firme e seguro do meu caminho, a solidão é como um cobertor de neblina que me deixa atento ao verdadeiro caminho sem distrações.

            Por dentro o trilho está bem traçado, cada dia dou mais um passo em direção a mim mesmo, mas o trilho externo e as forças que nele são exercidas requerem cuidado e discrição, não posso dar os mesmos passos errados que me levem a novas quedas, a próxima pode ser a última, não me posso dar ao luxo de escorregar de novo e cair no abismo do desespero.

            A energia que me move advém de te ter reencontrado no tempo e a cada vislumbre do teu olhar e do teu sorriso o meu coração dispara e a minha energia explode criando supernovas no meu universo interior.

            És a guia, a Força, eu sou o Louco Eremita perdido entre dois mundos, temo que não tenho a coragem necessária para poder ser mais do que sou, para romper esta barreira autoimposta de insignificância.

            Talvez seja isso, talvez deseje ser ninguém ou nada para alguém, talvez a voz na minha cabeça tenha razão e eu não mereça mesmo muito mais do que aquilo que sempre tive, vergonha, medo e desadequação, timidez, introversão, imbecilidade. Talvez sim, a minha voz interior saiba mais do que a credibilidade que lhe dou, talvez as tentativas de fugir ao turbilhão sejam apenas as correntes a serem aliviadas, mas nunca cortadas.

            Como um fantasma, um espírito moribundo perdido num tempo infinito, desencontrado do calor da afeição e da intimidade, do carinho e da invencibilidade, sou mais uma ilusão criada pela mente cruel da desesperança, talvez seja isso, um todo cheio de nada.

            Sinto-me só e não nego que a minha fragilidade seja tipo cristal e que se parte todos os dias, num ciclo eterno de plena inconsciente sigo invisível ao amor, nada me consegue tocar, ninguém sequer sabe que existo, apenas um fantasma a vaguear, uma carcaça fantasma de um navio que flutua à deriva sem cais.

            Quem me dera ser tudo mesmo não sendo nada, para ti, por ti, para mim, a alma que em mim reside reconhece a alma que em ti vive, não largo a corda que me sustenta a este sentimento, entre um último adeus e uma promessa de futuro feliz caminho inseguro tipo criança imberbe.

            Caio num sono de morte onde apenas o teu sorriso consegue iluminar o caminho e por entre as cartas do destino encontro as mil e uma linhas do que pode acontecer, um mar infinito de possibilidades prontas a serem reveladas pela intuição do Mago e a perícia espiritual de um Sacerdotisa.

            A beleza do teu rosto é o espelho da infinita libertação, agarro.me a essa memória sedento de ser maior que a minha dor e ser mais corajoso do que a velha cápsula que sustenta a minha carne.

            Um fantasma que vela a tua noite, beijando-te ao de leve nos lábios e tocando carinhosamente na tua face.

            Consegues sentir-me?

 Bruno Carvalho

Dez 2024

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